segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Apenas por hoje

Apenas por hoje
Todos os risos bobos estão libertados
já poderemos dançar nus pelos parques e praças
da cidade
sem que isso
signifique necessariamente insinuação de sexo
nossos falos que se falem
muitos suicídios foram tentativas
malsucedidas de voar
todos os desvarios já não são sinônimo de tédio
já poderemos lamber o box
dos banheiros públicos após limpar nossa consciência
sem que isso signifique ultraje
já poderemos
desemaranhar coraçõezinhos
com a pontinha dos medos virar as páginas em branco
escancarar as portas para o desconhecido
apenas por hoje aceitarei abraços clandestinos
musicarei cantadas toscas de pedreiro
lerei bulas na esperança de curar minha ressaca moral
até os injustos dormem
o futuro pertence ao campo dos porquês
o céu faz doce para minhas pupilas
gustativas através das nu
vens
todas as o
givas nucleares choram
já cometi a tolice de possuir certezas
apenas por hoje
ingiro manga com leite derramado sem morrer
salvo algumas exceções
e tento libertar garrafas de seus rótulos
apenas por hoje
eu gostaria de voar com a língua portuguesa pelo céu
da sua boca
e eu nem sei a diferença entre os porquês.

sábado, 31 de dezembro de 2016

celebração do abandono

orvalho
pequenas gotas que brotam na testa do cara que recolhe material
reciclável ou talvez
não
seja isso
talvez seja mesmo apenas suor o que torna tudo tão menos interessante?
pequenas gotas latinas de cerveja
reluzentes
frascos de pet
papel papelão caixas em geral
carrinho lotado difícil manobrar pelo jeito
desviar dos carros
buzinas
farois
rodinhas guinchando
na lateral pode-se ler facilmente
em letras irregulares abre aspas
eu estou celebrando o abandono
fecha aspas
eu sinceramente não sei não sei dizer se
isso se refere ao material recolhido ou a ele mesmo ou
é
apenas
mais uma metáfora pós moderna
penso nisso enquanto ele se afasta os pneus guincham as latinhas reluzem e
acho que estamos em abril
de algum ano
penso nisso enquanto tomo minha cerveja puro malte extra
aliás
super
recomendo.

terça-feira, 17 de novembro de 2015

A true history

Eu não sou um punheteiro suicida. Sou apenas um cara bêbado que mija perto de encostas perigosas à noite. E gosta de Huxley. São informações importantes. Embora meus vizinhos provavelemente não concordariam e embora não haja aparente ligação entre uma coisa e outra, enfim. Meu livro preferido desse autor é Contraponto. Gosto mais do que de Admirável Mundo Novo. Brave New World, se preferir. Já gostei mais deste do que daquele mas, de uns tempos pra cá, mudei de opinião. Ainda não li As portas da percepção, dele também. Então talvez eu mude novamente. Não tenho medo de mudar as minhas opiniões. Não vejo inconveniente. Elas são como roupas, que se desgastam com o uso e com o tempo. E precisam ser trocadas... Hehe. Droga. Sou péssimo com analogias, como se vê. Falei do livro porque estou indo devolvê- lo à biblioteca pública agora mesmo. Sim, eu devolvo meus livros emprestados. Não todos, que não sou de ferro também. Ou talvez seja. Ou um etê a considerar a opinião dos meus vizinhos. Eles não gostam de mim e não fazem questão de ocultar isso. Acho que é por eu não lhes dar bons dias nas ruas. Alguns deles ainda insistem em me mandar um "opa" de vez em quando. Qualquer hora, agarro-os pelo colarinho e pergunto: Mas que porra significa opa afinal? Não vejo importância em lhes dar cumprimentos hipócritas, mas eles não aceitam bem a coisa. Encaram isso como empáfia, como afronta. A julgar por eles, sou um caladão, introvertido e esquisito que muito provavelmente nutre psicopatias secretas na mente conturbada. Well, that's me. De qualquer modo não me importo, prefiro sair à noite quando os vizinhos estão dormindo. Saio, bebo e volto pra casa sem inconvenientes comunicativos. Eis a essência. Tudo o mais é acessório. Viver. Morrer. Bullshit. Estes dias quase morri de fato, aliás. Estava muito bêbado voltando pra casa. Precisava mijar. E foi o que fiz. No outro dia passando pelo local é que me dei conta de que mijei a centímetros da porra de um precipício. Ta certo que sou meio precipitado... Hehe. Merda. Sou horrível com trocadilhos também. Ocorre que a vegetação encobria a borda da tal encosta e estava noite e eu, bêbado. De modo que 30 centímetros de solo frágil me impediram de enfrentar uma queda de uns 15 metros. Eu despencaria de cara, como um pacote de merda bêbada. Com as calças arriadas e o pinto nas mãos. Imagino as manchetes. Poeta local encontrado morto em decorrência de queda. Com calças arriadas e pinto nas mãos. Suspeitamos tratar-se de mais um caso de punheteiro suicida, eles estão na moda hoje em dia e etc. Eu não sou um punheteiro suicida, mas quem acreditaria? Necropsia pra quê, diriam, apenas ensaquem esse cretino. Meus vizinhos teriam confirmadas suas suspeitas e gozariam felizes à noite. Uma boa gozada honesta em meses, anos, talvez. Droga. Não quero que minha morte, por mais miserável e inevitável que seja, sirva de estimulante sexual pra um bando de tarados daqueles. Em todo caso, acho preferível quase morrer do que passar a vida toda quase vivendo. Na expectativa de cumprimentos fingidos e suicídios ou homicídios estimulantes. Bom, vizinhos, se estiverem lendo isso aqui, espero que tenham uns bons dias e vão todos para o inferno depois.

segunda-feira, 30 de março de 2015

A simple song for Raissa

My dear friend, where are you? What are you doing?
Let me tell.
Today i changed some of my symbols on the totem of my soul. Today
I changed the skin spent some of my memories. And then i felt the cold touch of some absences.
Of voices and gestures, ideas, fears, rages and amenities. Some of them hurt. Yours hurts.
So please dont leave on my shoulders the weight of your entire silence today.
The words unspoken can die or even kill somethings in us.
The words and the world should not so scary as our thougts sometimes show us.
Not even strange erotic messages hidden in the beauty of fireflies and the chistmas light can explain us the real meaning
Of the smiles.
I have seen peculiar things lately, my friend. I have seen
Old men and dogs an houses thats doing the eternal return to the big nothing (or all, but whatever...)
On the sunset, every on the sunset, of afternoon through the fi(ni)shing line nicely.
And i know those man,
Dog
And houses
Are nothing but memories right now.
And if the thumb of the time would touches them now,
Although lightly,
They floated whit the dust of my thoughts and the lust of my lazy views.
They don't exist anymore to me and it's not so important.
But you are.
So, my dear and distant friend, dont become only a memory.
The slow transmutation of peoples in memories use to hurt more effectively than some firegun's shot.
Your silence joins the silence of the men and centuries, and together they produce slowly the misunderstanding's things.
Yours words usually is full of rocks and mountais and forests and secrets of minerals and vegetables things
And winds in dark clouds promissing storms falling and rising through the meanings.
That lives in the most beautiful part of human mysteries and its deep abysses of his missing eyes.
But i'm not afraid of monsters and ghosts that i'll might find in your words.
Even the most frightening words of a song are less terrifying than silence of absences.
And your presence is a beautiful
Colour in the wings of the butterflie's songs
Crossing the words
Linking peoples and feelings and views and meanings and ends and starts for every things.
You are that song.



segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Ode ao esquecimento




Às futuras gerações não pretendo deixar nada, o mundo
Não está melhor nem pior do que já estava quando aqui fui posto
Aos 33 anos já não possuo urgências nem ingenuidades
E percebo que o amontoado de meus dias
Serviu apenas para amarelar alguns de meus sorrisos
Deve ser esta a idade em que os heróis, por praxe, começam a esfumaçar
Diante da imprecisão dos ideais mais nobres
Vão, aos poucos, petrificando-se nas praças ante batalhas inacabadas
Ou alongando-se sobre a pele áspera das ruas por onde desfilam,
Alheios, os homens e os lugares comuns
Os gritos impetuosos que me nasciam
A todo tempo na garganta
Conclamando à luta contra os moinhos de vento que fatiam nuvens
Foram transformando-se aos poucos em clichês
Meus poemas já não fazem barulhos, não convocam a rebeliões
De que serviriam elas? Sobre as certezas frias, erram meus destinos
Perdem-se diante de palavras alheias, evadem para terras distantes
As minhas memórias tornaram-se, aos poucos, covardes frente aos fatos
Dou-me conta, e só agora, de que tenho gasto meu tempo
E esforço a construir o túmulo de minhas convicções
Ainda assim, alguns anseios pueris ousam habitar-me
Avanço de peito aberto contra as rajadas
Dos ventos e dos dias
Já não temo o frio do inverno
Nem revisito memórias aquecidas por verões passados
Trouxe até aqui, sem esmorecer, o peso dos homens que me precederam
Mas renego, agora, todos os nomes e títulos que me foram atribuídos
Por força de costumes, pois eles falharam em me definir
Devolvo tudo que me foi imputado pelos signos do nosso tempo
Não pretendo passar para a posteridade como um rótulo
Volto ao útero das coisas nu e desprovido de certezas
Como aqui cheguei
Sem nada saber, nada esperar, nada oferecer aos que ficarem
O esquecimento, entanto, há de me redimir.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Apague.A.Luz



Estou tentando algo. Experimental. Aqui. Há.
Algo rolando. Aqui. Algo como o seguinte.
Penso o seguinte. Imagine o seguinte.
Fracassaremos em fazer o seguinte.
Fracassaremos em dizer a palavra. Seguinte.
À pessoa. Seguinte. E no entanto. No momento.
Não. Comecemos novamente. Fracassar.
O ponto é que. Dentro em breve. Triste.
Todos os números. Primos morrerão.  Todos.
Os imortais. Morrerão. Todos os personagens.
De desenho. Animado. Morrerão.
Todos os elefantes velhos. Morrerão. Todos
Os cães e gatos abandonados. À própria.
Sorte. Morrerão. É um gesto simples. Veja.
Dois passos pra frente. Uma volta. Respire.
Um rodopio. Mas é opcional. Quem comanda.?.
É a dama. O cavalheiro deve deixar.
Um espaço pra jesus. Um espaço para.
Que seu pênis ereto não. Incomode.
Jesus. PORRA JESUS.!. Eu gritaria de madrugada.
Se isso fizesse algum sentido. Se isso.
Surtisse. Algum. Efeito. Eu tomaria.
Valium. Eu tomaria mais uma dose. Eu inventaria.
Mais uma roda. Eu faria. Um milagre. Ressuscitaria.
A merda do amor. Se você dissesse. Que ficaria. Bêbada
Pra sempre. Comigo. Eu diria UAU.!. EU COMPRENDERIA.
O cosmos. Eu compraria um carro. Usado.
Mas rodando. Em prestações. Eu iria até o fim.
Até o fim. ATÉ O FIM. Ficaria doido. Ficaria rico. De repente.
Eu faria as promessas. Todas. Até as impossíveis.
Até as que eu não estou. Muito. Disposto.
A cumprir. Postaria. Frases bestas. No.
Face. Book. Tipo. EU S2 VC. Que mais.?. que mais.!.
Este é o ponto. Esta é a gravidade. Nos puxando.
Este é o caminho. Nos perdendo. Agora.
Estamos em algum lugar. Perdidos. Agora estamos.
Agora estamos em algum tipo. De transe.
De transa. De trânsito. Riedade. Eu. E.
Você. E. eles. E nós não. Nos conhecemos.
Direito. E nós não. Estamos muito a fim.
A fim. De conversar. Sobre Foucault. Sobre o poder.
Que loucura. O céu é. Uma loucura azul seus. Seios.
São uma loucura. Uma loucura. Gostosa eu olho. Digo.
Eu. Olho.  Ela. Olha. Tudo está tão. Tudo se foi.
Ela. Olha. Nós pensamos. E. Se. Simplesmente.
Alguém agarrasse. O meu crânio. E chacoalhasse.
De modo. Que meu cérebro. Viraria. Alguma
Coisa. Gelatinosa. Que vertesse de meus.
Olhos. Lágrimas abstratas. E de meus. Ouvidos.
Sonatas de Bach. E de minha. Boca. Todas as palavras.
Até as sem sentido. Até as em desuso. Até as feias.
Até as desnecessárias. Até as mortas. Até a minha alma.
E minha alma surgisse. E ela fosse. Felpuda. E pegajosa.
Pequeno. Burguesa. E fosse. Muito infantil. E.
Verde. E ela fosse. Um ETE. E ela fosse.
Domesticada. Esticada. E soubesse rolar. E.
Fingir-se de morta. E apanhar. O jornal.
E ela começasse. Algo. Experimental. Tipo.
Contar os meus segredos. Profundos. Tipo.
Eu já quis. Aprender leitura dinâmica. Eu já adorei.
A bomba. Atômica. Eu já transei com um amigo. Imaginário.
Eu já quis te matar. De prazer. Eu já quis me matar.
Pra valer. Eu já vou. Nós já fomos. Apague a luz. Quando
Sair da minha vida. Por favor.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Castelo de areia




O mar estava calmo. Algumas crianças brincavam na praia a certa distância, com os pais. Ao longe as gaivotas faziam algazarra sobre as águas. O sol ia tingindo lentamente o horizonte de vermelho. O homem estava sentado sobre uma pedra e oferecia a face à brisa marinha. De quando em quando uma gaivota voava mais perto e ele regressava de seus pensamentos para admirá-la. Havia poucas nuvens e, lá longe, um pequeno ponto prateado passava deixando um rastro branco e comprido no céu. Ele pensou nas minúsculas pessoas que deveriam estar dentro daquele pontinho, e que neste momento talvez estivessem com suas cabeças cheias de compromissos e destinos. De sua atual perspectiva, aquelas pessoas com seus compromissos, por mais importantes que fossem, pareciam-lhe distantes e alheias. Dentro de algumas horas nem mesmo aquele traço branco restaria no céu para evidenciar a passagem de alguém por ali. O céu tem a memória muito curta, pensou.
Então ele percebeu que a bola com que as crianças brincavam veio parar perto de onde estava. Levantou-se e lançou-a em direção a elas com um movimento desajeitado. A família estava de partida. O homem apanhou a bola e agradeceu com um aceno amistoso. Depois foram-se afastando em direção à cidade. Ele ficou admirando as silhuetas da família enquanto partiam, as crianças correndo e gesticulando. Até que não conseguiu mais vê-los.
Agora em pé e só, podia sentir melhor o vento que vinha do mar. Ouviu o barulho ritmado das ondas. Aos poucos foi ao seu encontro. Sentiu a água congelar-lhe os pés e recuou um pouco, mas logo se acostumou à sensação e prosseguiu. Quando estava com a água pela altura do peito, pode sentir plenamente a força das ondas. Não opôs resistência. Apesar de tudo, era uma sensação bastante agradável. Lembrou-se de quando era pequeno e tinha medo do mar e do barulho das ondas. Lembrou-se dos castelos de areia que fazia com ajuda do pai. Pensou na infância e adolescência que tivera, e se deu conta de que sempre teve de contar com ajuda dos outros. Teve a sensação de que nunca realizou nada realmente sólido e seu. Passara a vida até aquele momento sendo ajudado a construir seus castelos de areia. Depois do falecimento do pai, trocara sua figura assessora pela da mãe. Depois pela da esposa. E pensou na fragilidade de suas conquistas. E lembrou-se do dia em que ficara sabendo da doença da mãe. E do dia em que, há exatos sete anos, havia trazido a mulher e crianças a esta mesma praia. A última lembrança que lhe restou da família. E seu culpou por ter sobrevivido.
Mas uma onda o suspendeu com violência e ele percebeu subitamente que estava muito frio. A água agora encobria totalmente seu corpo até a altura do pescoço e manter a posição exigia cada vez mais esforço. Os pés não tocavam mais o fundo, e ele flutuava sofregamente com movimento de pernas. Percebeu que o mar o estava levando. O mar, desde sua infância, o estava erodindo e levando aos poucos: seus votos de final de ano, seu carro, casa, emprego bom. Pensou no mar levando as viagens que havia planejado fazer com a família, e que não saíram do papel. Levando o cachorro, o antigo armário da mãe, o olhar da esposa ao amanhecer, o sorriso dos filhos. Olhou em direção à cidade. Lá longe as luzes já acesas. Procurou identificar a direção de sua antiga casa. Deu-se conta de que lá não havia mais nada pra ele.
Abriu subitamente os olhos. Não sentia mais frio, o corpo leve, como que se diluindo, deixando-se levar, misturando-se ao mar. Dissolvendo-se às ondas, como um castelo de areia.