terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Desta vez

Desta vez não se aborreça comigo
Por eu não estar presente o tempo todo
Por faltar-me sempre coerência
Por eu me mentir e me aceitar mentira
Por não ter te dado céus e luas!

Não se ofenda se às vezes pareço distante, alheio
Por faltarem-me certezas acerca das coisas e da vida
por eu parecer fraco, por ser fraco
Por me recusar às bengalas sociais e morais o tempo todo
Acho que prefiro mancar dignamente

Não tome como insulto a minha ausência em minha própria vida
Eu nunca estou quando precisa
Nem quando eu preciso estou! Eu nunca estou...

Não me julgue mal por eu não saber todas as respostas
Nem por eu não saber o caminho e estar perdido
É que os fatos da vida não possuem mapas

Não se zangue se te perco às vezes, se te esqueço às vezes
Nos lugares
São tantos os lugares onde não estamos juntos

Não se amargure
Pelo meu olhar confuso, meu sorriso triste
Pela angústia que adorna meu rosto
Por meus beijos insípidos e sem cor

Não vá embora!
Bata novamente em meu peito oco por favor
Quem sabe alguém atenda desta vez...

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Ausência bela

Despiu-se das roupas, todas...
E dos pudores impostos pelas roupas
Das vontades
E dos desejos e dos medos
(Roupas ainda)

Despiu-se de todas as verdades-panos
E preconceitos
E certezas-vendas

Despiu-se do sol
De toda a luz do sol de seus próprios olhos
E de quaisquer outros

E de suas saudades
Das cidades de gentes que a habitavam
De seus cemitérios
De pessoas, momentos e lembranças...

Despiu-se dos sonhos
Da angústia dos sonhos irrealizáveis
Da solidão de imaginar-se só
Ou acompanhada
Ou só mesmo acompanhada

Do que fora
Do que julgava ser
Do que seria despiu-se

E por trás de tudo que era ela
Só restou no mundo uma ausência bela.

sábado, 15 de janeiro de 2011

Beleza aguda

Acho a beleza complicada
Nos olhos antigos
Daquele homem simples esperando o ônibus
E dói
Saber que somos ambos tão distantes do sorriso.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Flores em botão

Sempre que venho a este parque
Admiro-me com estas pequeninas flores em botão
Fico pensando no mistério e na beleza
Das flores que estes botões ocultam

E penso com tristeza nos desencontros humanos

Penso como nem sempre conseguimos ficar ao lado
Das pessoas de quem mais gostamos
Nem sempre...

E podemos apenas adivinhar-lhes o macio toque,
O olhar doce ao acordar em sua companhia de manhã,
Ou aquele pequeno sorriso que nos faria felizes por uma vida
E apenas aquela pessoa nos poderia dar

Penso tristemente como às vezes
Os carinhos, beijos e afagos tão desejados
Por duas pessoas que se gostam tanto
Ficam apenas nos olhos e na imaginação

Que deu errado?
Talvez a falta de coragem de dizer e fazer o que deveria ter sido dito e feito
Em seu devido tempo
Talvez a cegueira que a vida nos impõe
Às coisas que realmente nos são importantes
Ou o movimento insólito do mundo
Que sempre nos empurra seus valores
E nos afasta mais e mais do que desejamos

No final tudo segue seu rumo
E estas felicidades abortadas
Acabam por cristalizar-se em nossa lembrança
Como botões
Pequenos botões de flores que nunca desabrocharão

Mas quem sabe,
Quando eu voltar um dia a este mesmo parque...


terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Fortalezas

É estranho como toda a nossa estranheza
De nós mesmos
Com o tempo se dissolve ou se solidifica
E nos irmanamos a ela, a aceitamos
Sem mais questionamentos

Passamos a fingir que nos conhecemos
Muito bem
Fingir saber exatamente o que queremos
E para onde vamos e coisas do tipo

Estranho como nossos castelos de areia
Tão frágeis e delicados
Tornam-se fortalezas inexpugnáveis
Para nós
Com o passar do tempo.

Fuga

Fujo
E me despedaço
Contra o muro concreto
Desta inconsistência

Arrastado pelo vórtice
Dos sentimentos
Que renego

Cego do absurdo
Mudo
E permaneço mudo.