sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Extimidade


Hoje a minha intimidade está exposta, intimamente...pra que cerimônias? Vivo há trinta e um anos comigo e “mau” me conheço. Meus projetos de final de ano nunca se realizaram. E eu penso com tristeza no estreito de Bering. Minha cabeça pende para fora, o barulho da rua me seduz, me espanta, mas eu quero ser espantado. Acho que existe uma rua em meu peito por onde transitam meus sonhos de infância, eles nunca respeitaram os sinais de trânsito, nem as placas de pare e nem os limites da imaginação. Detesto a palavra pouso, o pouso é a morte do voo. O agora é sempre depois e o depois nunca virá, já se sabe. Mas é bom ter dúvidas sobre o que sabemos absolutamente certo. Dia desses acordarei com dois pés esquerdos, pois nada é direito comigo. A chuva pintou um belo quadro abstrato na minha parede. Os homens não morrem, viram lembranças, é triste a lenta transformação de pessoas em lembranças, de lembranças em esquecimento. Andar é mais difícil do que parece, o próximo passo pode ser o último. Eu me abstenho de ser eu, não gosto de ditaduras. O silêncio imediatamente anterior à música, a escuridão imediatamente anterior ao seu olhar resumem tudo...flashhh...shhh...o seu silêncio faz barulho em mim. Será que os dias sentirão falta de mim? Padeço do mal de ser homem, sou mirrado, escasso, fragmentário e tenho prazo de validade. Às vezes estou nos meus olhos, às vezes nas minhas mãos...mas geralmente nas suas, agora estou nos seus olhos. A minha melhor definição de mim envolve um isqueiro, um liquidificador, três lâmpadas fluorescentes, um toca-fitas e um guarda-chuva. Mas a minha melhor definição de mim nunca é pra mim, é sempre pros outros, o que é um tédio. Admiro o homem que acabou de dobrar aquela esquina e se evadiu, deixando meu olhar a esmo. Quem compôs as canções do vento? Não há manuais para o amor, não se ensina amor nas escolas, não há cursos, regras, normas, convenções, o amor é o caos. Os meus labirintos levam-me a você, estou perdido. Às vezes os adeus se disfarçam de até logo. Hoje a minha intimidade está imposta!

Nunca se sabe


Nunca se sabe como que isso deve ser lido, se na primeira ou no verão, se na sala ou no porão, se escovando os dentes, se debaixo de um jarro, se de trás pra frente, se de dentro pra fora, se nessa ou em nenhuma ordem, se em um sonho ou em outro idioma, se tirando os sapatos, se uivando pra lua ou adornando o sol, se oculto entre as retinas vazias ou as rotinas cheias, se pressionado pelo ontem e o amanhã - o qual sempre é um pouquinho mais pálido do que o hoje - ou se não deve, isso mesmo, se não deve ser lido, deve ser queimado, abandonado, esquecido, ignorado, se deve ser posto junto àquele limbo de documentos importantíssimos empilhados em algum canto da casa, e que jamais leremos...nunca se sabe o que nos leva a fazer, o que nos trouxe aqui,  o que no deixará amanhã, que sairá cedo dizendo que já volta, que vai apenas até a esquina comprar cigarros, mas que sabemos não voltar porque não fuma...nunca se sabe por exemplo como é que os acendedores de lampião vivem hoje em dia, depois da luz elétrica, das lâmpadas, dos faróis os acendedores ficaram sem emprego, como vivem hoje, como vivem seus filhos ou seus netos, de certo vivem de contar as histórias magníficas de seus antepassados, meus avós, dizem, eram heróis, acendiam lampião, afugentavam a noite das ruas, nunca se sabe se algum dia alguém, não algo, mas alguém voltará para acender as luzes.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Tiques

Tenho onze horas
Alguns meses
Um ano e trinta de vida
Muitos taques e outros tiques

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Dizem


Dizem que há poesias embaixo dos cobertores
Escondidas por entre as pernas do sexo
Tremendo de gozo, de frio, de amor, de medo

Nos campos de concentração
As poesias magras e pálidas sustentam homens dentro dos homens
Dizem que há poesia dentro dos homes
Fazendo revoluções, involuções, evoluções
A poesia é redonda e azul como o mundo, ou não

A poesia não torna os homens melhores, isso é autoajuda, suponho
A poesia torna os homens humanos! E isso basta pra mim

Finais felizes

Nenhum príncipe ou princesa jamais voltou pra contar.

Segunda-feira


Mãe, sorriso, portão, chave, vento, digo brisa, pedaço de céu, pedaços de árvores, nuvens, pedaços de lembranças, pessoas que passam, por quem passamos, pessoas que gostaríamos de conhecer, pessoas que nem reconhecemos, pessoas que nos ignoram, pessoas que ignoramos, pressa, horas, distração, barulho, buzina, medo, susto, sorriso, grama, rua, mais rua, trabalho...dia...caminho de volta, uma vida para endireitar e uma esquina a mais pra dobrar: segunda-feira.

O branco

O branco matou os desenhos do muro lá perto de casa.

Maquiagem

Sinto nojo
Na náusea do enjoo e do nojo
Que trago entre o espelho e o batom no estojo
De maquiagem da vida.