O seu olhar
Que passa
E que fica
Pacifica.
sexta-feira, 25 de novembro de 2011
terça-feira, 22 de novembro de 2011
sábado, 19 de novembro de 2011
A verdade
Por fim
O que não entendermos
Deve mesmo ser a verdade
Não aquela apregoada pelos sábios,
Pelos profetas, e os reis, e os imperadores, e os deuses...
Não,
A verdade eu acredito
Deve se parecer bem mais
Com aquilo que uma criança vê
E não consegue explicar
E
Que mais tarde ela explicará
Não mais conseguindo ver.
Como declamar Drummond
Como declamar Drummond...
Pegue um copo de água bem cheio
De preferência
Um bom copo de água fresca das Minas
Colhido na fonte
Agora derrame
Um bom copo de água fresca das Minas
Não entende nada de Drummond
Tudo o mais
Que vive, que respira, que suspira
Já nasce declamando Drummond dentro da alma.
sexta-feira, 18 de novembro de 2011
Aninha-me
Aninha-me no céu
Que o seu olhar promete
Que
Entre seus lábios
O seu sorriso reflete
Mais céu
Que o céu de todos os espaços
Aninha-me no céu
Do espaço entre os seus braços.
Que o seu olhar promete
Que
Entre seus lábios
O seu sorriso reflete
Mais céu
Que o céu de todos os espaços
Aninha-me no céu
Do espaço entre os seus braços.
quarta-feira, 16 de novembro de 2011
Poema de sete "Faces"
Quando nasci
A torto e a direito
As almas já estavam alugadas
As casas não
As vidas já estavam lotadas
Os bondes não
Os amigos estavam no “face”
Os bigodes não
Fui às sombras
Mancando
Procurar meu anjo
Os anjos já estavam esgotados
As tristezas não
Mundo, mundo, vasto mundo
Mais devastado é o meu S2.
Acorde
O poema
Costuma
Dançar
De madrugada
Enquanto tudo dorme
Apenas o poema
Rima
Com minha alma
Acordada.
Pão
Enquanto
Grossos calos se formam
Nas mãos cansadas
Que colhem o trigo
De que será feito meu pão
Eu alheio
Acaricio
Com minhas mãos macias
As tuas mãos vazias.
sábado, 12 de novembro de 2011
Desforra - José Saramago
O rapaz vinha do rio. Descalço, com as calças arregaçadas acima do
joelho, as pernas sujas de lama. Vestia uma camisa vermelha, aberta no peito,
onde os primeiros pêlos da puberdade começavam a enegrecer. Tinha o cabelo
escuro, molhado de suor que lhe escorria pelo pescoço delgado. Dobrava-se um
pouco para frente, sob o peso dos longos remos, donde pendiam fios verdes de
limos ainda gotejantes. O barco ficou balouçando na água turva, e ali perto,
como se o espreitassem, afloraram de repente os olhos globulosos de uma rã. O
rapaz olhou-a, e ela olhou-o a ele. Depois a rã fez um movimento brusco e
desapareceu. Um minuto mais e a superfície do rio ficou lisa e calma, e
brilhante como os olhos do rapaz. A respiração do lodo desprendia lentas e
moles bolhas de gás que a corrente arrastava. No calor espesso da tarde, os
choupos altos vibraram silenciosamente, e, de rajada, flor rápida que do ar
nascesse, uma ave azul passou rasando a água. O rapaz levantou a cabeça. No
outro lado do rio, uma rapariga olhava-o, imóvel. O rapaz ergueu a mão
livre e todo o seu corpo desenhou o gesto de uma palavra que não se ouviu. O
rio fluía lento.
O rapaz subiu a ladeira, sem olhar para trás. A erva acabava logo ali.
Para cima, para além, o sol calcinava os torrões dos alqueives e os olivais
cinzentos. Metálica, duríssima, uma cigarra roia o silêncio. À distância, a
atmosfera tremia.
A casa era térrea, acachapada, brunida de cal, com uma barra de ocre
violento. Um pano de parede cega, sem janelas, uma porta onde se abria um
postigo. No interior, o chão de barro refrescava os pés. O rapaz encostou os
remos, limpou o suor ao antebraço. Ficou quieto, escutando as pancadas do
coração, o vagaroso surdir do suor que se renovava na pele. Esteve assim uns
minutos, sem consciência dos rumores que vinham da parte de trás da casa e que
se transformaram, de súbito, em guinchos lancinantes e gratuitos: o protesto de
um porco preso. Quando, por fim, começou a mover-se, o grito do animal, desta
vez ferido e insultado, bateu-lhe nos ouvidos. E logo outros gritos, agudos,
raivosos, uma súplica desesperada, um apelo que não espera socorro.
Correu para o quintal, mas não passou da soleira da porta. Dois homens e
uma mulher seguravam o porco. Outro homem, com uma faca ensanguentada,
abria-lhe um rasgo vertical no escroto. Na palha brilhava já um ovóide
achatado, vermelho. O porco tremia todo, atirava gritos entre as queixadas que
uma corda apertava. A ferida alargou-se, o testículo apareceu, leitoso e raiado
de sangue, os dedos do homem introduziram-se na abertura, puxaram, torceram,
arrancaram. A mulher tinha o rosto pálido e crispado. Desamarraram o porco,
libertaram-lhe o focinho, e um dos homens baixou-se e apanhou os dois bagos,
grossos e macios. O animal deu uma volta perplexo, e ficou de cabeça baixa,
arfando. Então o homem atirou-lhos. O porco abocou, mastigou sôfrego, engoliu.
A mulher disse algumas palavras e os homens encolheram os ombros. Um deles riu.
Foi nessa altura que viram o rapaz no limiar da porta. Ficaram todos calados e,
como se fosse a única coisa que pudessem fazer naquele momento, puseram-se a
olhar o animal que se deitara na palha, suspirando, com os beiços sujos do
próprio sangue.
O rapaz voltou para dentro. Encheu um púcaro e bebeu, deixando que a
água lhe corresse pelos cantos da boca, pelo pescoço, até aos pêlos do peito,
que se tornaram mais escuros. Enquanto bebia, olhava lá fora as duas manchas
vermelhas sobre a palha. Depois, num movimento de cansaço, tornou a sair de
casa, atravessou o olival, outra vez sob a torreira do sol. A poeira
queimava-lhe os pés, e ele sem dar por isso, encolhia-os, para fugir ao
contacto escaldante. A mesma cigarra rangia, em tom mais surdo. Depois a
ladeira, a erva com o seu cheiro de seiva aquecida, a frescura entontecedora
debaixo dos ramos, o lodo que se insinua entre os dedos dos pés e irrompe para
cima.
O rapaz ficou parado, a olhar o rio. Sobre um afloramento de limos, uma
rã, parda como a primeira, de olhos redondos sob as arcadas salientes, parecia
estar à espera. A pele branca da goela palpitava. A boca fechada fazia uma
prega de escárnio. Passou tempo, e nem a rã nem o rapaz se moviam. Então ele,
desviando a custo os olhos, como para fugir a um malefício, viu no outro lado
do rio, entre os ramos baixos dos salgueiros, aparecer outra vez a rapariga. E
novamente, silencioso e inesperado, passou sobre a água o relâmpago azul.
Devagar, o rapaz tirou a camisa. Devagar se acabou de despir, e foi só
quando já não tinha roupa nenhuma no corpo que a sua nudez, lentamente, se
revelou. Assim como se estivesse curando uma cegueira de si mesma. A rapariga
olhava de longe. Depois, com os mesmos gestos lentos, libertou-se do vestido e
tudo quanto a cobria. Nua sobre o fundo verde das árvores.
O rapaz olhou uma vez mais o rio. O silêncio assentava sobre a líquida
pele daquele interminável corpo. Círculos que se alargavam e perdiam na
superfície calma, mostravam o lugar onde enfim a rã mergulhara. Então, o rapaz
meteu-se à água e nadou para a outra margem, enquanto o vulto branco e nu da
rapariga recuava para a penumbra dos ramos.
terça-feira, 8 de novembro de 2011
domingo, 6 de novembro de 2011
Presságio
Eu não sei dizer
Mas eu te sinto
Eu não sei tentar
Mas eu te quero
Eu não sei seguir
Mas eu te chamo
Eu não sei se vens
Mas eu te espero.
Bastante
O meu plano é curvo
O meu dia é tarde
O meu tempo urge
O meu peito arde.
O que tenho: é nada
O que busco: é tudo
O que faço: eu erro
O que sou: eu mudo.
Eu não tenho crença
E não tenho casta
Tenho uma certeza:
Eu te amo, e basta.
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