sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

É isto o homem? (fragmento) - Primo Levi


“Aqui estou, então: no fundo do poço. Quando a necessidade aperta, aprende-se em breve a apagar da nossa mente o passado e o futuro. Quinze dias depois da chegada já tenho fome regulamentar, esta fome crônica que os homens livres desconhecem; que faz sonhar à  noite; que fica dentro de cada fragmento de nossos corpos. Aprendi a não deixar que me roubem; aliás, se vejo por aí uma colher, um barbante, um botão dos quais consiga tomar posse sem risco de punição embolso-os, considero-os meus de pleno direito. Já apareceram, no peito dos meus pés, as torpes chagas, que nunca irão sarar...Empurro vagões, trabalho com a pá, desfaleço na chuva,tremo no vento; mesmo meu corpo já não é meu; meu ventre está inchado, meus membros ressequidos, meu rosto túmido de manhã e chupado à noite; alguns de nós têm a pele amarelada, outros cinzenta; quando não nos vemos durante três ou quatro dias custamos a nos reconhecer.”

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